Somos um povo triste.
Não é preciso ir longe para perceber isto. O Fado diz-nos muito. A nossa música diz-nos muito.
Ouvimos boa música portuguesa e percebemos que não temos boa música se esta não é triste.
Ouvimos vezes e vezes sem conta as nossas músicas preferidas portuguesas e de todas as vezes cresce uma tristeza em nós que é de tal significado que se torna uma tristeza cheia, uma tristeza que já faz tanto parte de nós que é bem-vinda.
A maior parte dos povos não entende isto. Não entende porque nos agarramos tanto às coisas menos boas da vida e fazemos música com elas. Somos, realmente, paradoxais. Pegamos em algo que de raiz devia ser algo alegre e tornamos-o melancólico, carrancudo, negro, pesado. No entanto, como nós fazemos poucos sabem fazer; tornar algo, apesar de pesado e triste, bonito, de tão cheio de verdade, de significado, de emoção, não é fácil. Agarramos em todos os nossos sentimenos menos bons, em todas as nossas emoções negativas e transformamos-as em músicas belas, tocantes, sinceras, cheias, sensíveis, com essência.
Esta é uma das razões porque amo ser portuguesa e sinto que não podia ser de outra nacionalidade qualquer.
Sinto que sou portuguesa dos pés à cabeça, e tenho orgulho nisso. Orgulho da tristeza incrustada na nossa alma mas ao mesmo tempo de uma esperança que nunca morre, de um sorriso genuíno, da lágrima que é também sempre tão genuína. Orgulho da maneira como vivemos, da nossa solidariedade e constante preocupação com tudo e todos. Orgulho de sabermo-nos desenrascar em qualquer situação mesmo que por vezes não tenhamos a mínima ideia do que estamos a fazer. Orgulho do amor que temos para dar que é sempre tanto apesar de em certas alturas escondido. Orgulho de sabermos respeitar os outros mesmo que nem sempre nos respeitemos a nós próprios. Orgulho, porque ser portuguesa para mim não é apenas viver em Portugal mas sim fazer parte de uma história e de um mundo que é muito nosso. É uma identificação partilhada, olhamos em volta, olhamos para as pequenas coisas e estamos em casa.